Leão ao Valor: Historicamente, Petrobras é única desbravadora de novas fronteiras no país

Valor Econômico
Imagem na cor azul escuro, com o logotipo do Ineep ao centro.

Historicamente, a Petrobras é a única descobridora relevante de novas fronteiras no país. Com a política de desinvestimento da estatal, não há sinais de que outra empresa privada venha a ocupar esse posto no médio prazo, o que pode levar a uma situação temerária de esgotamento das reservas nacionais.

 

A Petrobras foi a única grande responsável pelas descobertas tanto da Bacia de Campos como do Pré-Sal. “As demais empresas sempre tiveram papel marginal e sempre foram avessas ao risco”. explica Rodrigo Leão. O economista lembra o caso emblemático do Pré-Sal. “O primeiro poço foi perfurado em parceria com outras empresas, mas elas desistiram quando o investimento começou a ficar muito caro e vendeu sua parte para a Petrobras”. Estrategicamente, é preciso entender que o petróleo brasileiro é apenas mais um ativo em meio a um portfólio gigante de investimento dessas empresas multinacionais, portanto é óbvio que elas concentrem seus esforços em locais geologicamente mais conhecidos e até em novas formas de energia. “Não há motivos para que empresas estrangeiras escolham novas áreas ainda não mapeadas no Brasil como prioritárias. Por isso mesmo o papel da Petrobras é tão importante”.

 

O economista Rodrigo Leão, coordenador-técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra (Ineep), conversou sobre o assunto com o jornal Valor Econômico, para a matéria “Novas fronteiras ficam em segundo plano“, publicada nesta terça-feira (22):

 

Rodrigo Leão lembra que o declínio da Bacia de Campos foi compensado, nos últimos anos, pela descoberta do pré-sal. E afirma que a tendência é que o pré-sal, nas próximas décadas, também viva uma queda natural de sua produção.

 

“Uma petroleira do tamanho da Petrobras não pode parar de buscar novas fronteiras. É um processo longo de construção. Não pode esperar chegar num estágio temerário de queda das reservas. Mas não vejo no curto prazo uma mudança [na concentração dos investimentos em Campos e Santos]”, afirma Leão, que é pesquisador-visitante da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

 

Segundo ele, é difícil dizer, hoje, quem vai assumir o papel de desbravador de novas fronteiras, no Brasil. Ele destaca que as petroleiras, sejam elas as gigantes do setor ou as petroleiras menores, historicamente, sempre trabalharam na esteira da Petrobras, atuando em áreas onde já há descobertas.

 

“Total, Shell e Equinor estão há mais tempo no Brasil e conhecem mais a geologia brasileira. Podem despontar como novas desbravadoras. Mas não há nenhum sinal claro, nenhum interesse manifesto ainda de que isso vá se concretizar”, disse.

 

Petroleiras médias, por sua vez, têm orçamentos mais limitados e tendem a explorar novas fronteiras num ritmo mais lento, comenta o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-diretor da ANP, Hélder Queiroz. “Antigamente havia um uso da Petrobras para exploração de novas fronteiras”, lembrou.

 

Ele destaca, ainda, que problemas no licenciamento de poços em novas fronteiras contribuem para reduzir o interesse por essas regiões. E lembra o caso da francesa Total, que pagou cerca de R$ 250 milhões pela aquisição de cinco concessões na Bacia Foz do Amazonas em 2013, mas teve o seu pedido de licença para perfuração nas áreas negado pelo Ibama. Seis anos após a compra dos ativos, a multinacional terá que reiniciar o processo de licenciamento.

 

O resultado da 16ª Rodada de concessões, neste mês, traduz esse desinteresse. Em meio à crise ambiental provocada pelo vazamento de óleo no litoral do Nordeste e diante de ações na Justiça contra a oferta de áreas com eventual risco de impacto no parque de Abrolhos, os blocos do Nordeste não atraíram uma proposta sequer.

 

O jornal também conversou com a ex-diretora-geral da ANP e consultora da FGV Energia, Magda Chambriard, que disse que o interesse menor das petroleiras por áreas de menor conhecimento geológico está associado ao cenário de preços do petróleo. Ela lembra que o caso bem-sucedido da 11ª Rodada se deu num momento em que a cotação da commodity superava os US$ 100 o barril.

 

“Com a queda dos preços, as petroleiras reagiram e reduziram investimentos em exploração. Aos poucos, elas estão repondo seus portfólios, mas com muito mais cautela. Daí a importância do pré-sal para elas. É uma questão de interesse ao risco. Os riscos assumidos hoje são muito diferentes daqueles de 2013, 2014”, afirma.

 

Magda não acredita que a exploração de novas fronteiras acontecerá de forma rápida. Mesmo tendo alguns ativos fora do eixo Campos-Santos em suas carteiras, as companhias tendem a priorizar a exploração nessas duas regiões. “Elas estão com carteiras de projetos cheias de ativos de baixo risco e tendem a acelerar a exploração do pré-sal. Não dá para retardar algo pelo qual elas pagaram bilhões. Elas têm que ter um retorno rápido”, comenta.

 

Para a consultora, faz mais sentido, neste momento, falar em novas fronteiras tecnológicas do que em novas fronteiras geográficas. “Vamos esbarar em limites tecnológicos que terão de ser ultrapassados no pré-sal, conforme exploramos cada vez mais águas mais profundas”, disse.

 

A consequência de focar as atividades em Campos e Santos, segundo ela, será a concentração geográfica dos investimentos no eixo Rio-São Paulo. “Isso é um empecilho para descentralizar investimentos para outras regiões”, comenta.

 

Leia a íntegra da matéria de André Ramalho no jornal Valor Econômico: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2019/10/22/novas-fronteiras-ficam-em-segundo-plano.ghtml

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